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Telas de agosto

Telas de agosto

Este mês há destaques especiais na corrente de cartazes cinematográficos com produções realizadas no Brasil durante o período do pós-pandemia. Agora, elas começam a estrear.

Um dos primeiros filmes nacionais a ocupar as telas dos cinemas, em agosto, é Estranho Caminho, dirigido pelo cearense Guto Parente, que mantém referências diretas ao período da crise de Covid-19. Seu protagonista retorna à cidade natal motivado por uma necessidade urgente de se reconectar com o pai, a quem não vê há mais de dez anos. Mas o reencontro, pontuado por tensão e esperança, no início parece que será um primeiro passo para uma reconciliação. Porém, à medida que a pandemia se alastra e a cidade enfrenta um cenário de medo, o jovem se vê imerso em uma série de fenômenos estranhos que desafiam a sua compreensão da realidade e da relação familiar. Reconciliação em família e medo do vírus se misturam na trama bem engendrada.

O Contato se inclui no pacote de dezenas de produções cinematográficas feitas aqui, e com frequência cada vez maior, abordando o tema da presença e da atuação resiliente dos indígenas brasileiros diante das perseguições a que são submetidos e das ocupações ilegais dos seus territórios por grupos do agronegócio. Um assunto que, durante os anos recentes, vem ocupando os tempos de reflexão, fantasia e inquietação da população diante até da possibilidade da erradicação dos nossos povos originários, em longo prazo, diante da violência à qual vêm sendo expostos com violência cada vez maior.

No caso, O Contato, dirigido pelo carioca Vicente Ferraz, é especial porque, no roteiro, que também é de Ferraz, os seus três grupos de personagens falam em vários idiomas originários. São indígenas moradores dos territórios do Alto do Rio Negro, no Amazonas, e relatam fatos da história da colonização da região desde os primeiros contatos entre indígenas e não indígenas até os dias de hoje.

Outro cartaz que merece toda atenção é O Mensageiro, com estreia na próxima semana, dia 15 de agosto. Trata-se do mais recente trabalho da diretora carioca Lúcia Murat. Começou a ser filmado em 2020 e já está selecionado para três festivais estrangeiros. Lúcia, ex-militante da luta armada política do período da ditadura civil-militar de 64, é reconhecida como uma das mais competentes autoras de filmes clássicos, como Que Bom te Ver Viva, de 1989, e Doces Poderes, de 1995.

Diz a diretora a propósito de O Mensageiro: “Houve uma tentativa de ‘apagamento’ do que foi a ditadura. Por isso, quis contar uma história daquele período de exceção para a nova geração. Negava-se a memória e a existência da ditadura, mas é importante a gente mostrar, de novo, que ela existiu, foi um horror e foi também o período ditatorial mais longo na América Latina”. Para quem não sabe: a diretora foi presa e torturada pela sua ação política quando tinha 20 anos.

Lúcia Murat iniciou sua militância na universidade e foi uma das estudantes presas no Congresso da União Nacional dos Estudantes, a UNE, em Ibiúna, São Paulo. Após o Ato Institucional Nº 5, o famigerado AI-5, entrou na clandestinidade. “Eu me lembrei do passado para discutir questões do presente, como polarização, perdão, julgamentos que não foram feitos e o horror da ditadura. Então, acho que é um filme muito contemporâneo, apesar de se passar em 69”.

“A importância dele também é justificada pelo recente momento que o Brasil acabou de viver e no qual se tentou reescrever a história e negar a existência da ditadura militar. Um filme que discute essa reescrita e o apagamento de fatos históricos desses tempos sombrios é essencial”.

“Mas ao mesmo tempo”, comenta Lúcia Murat, “O Mensageiro trabalha uma questão muito contemporânea que é a polarização e a possibilidade de diálogo. Por isso, acreditamos que ele deve ter uma repercussão que não se limita ao Brasil, podendo atingir vários países e públicos”.

O seu elenco é irretocável, envolvente e concentrado, e oferece suporte essencial ao desenvolvimento da trama. A atriz Valentina Herszage faz o papel de Vera, jovem de classe média e presa política durante a ditadura militar, que na prisão conhece o soldado Armando (ator Shi Menegat). Ele decide levar uma mensagem tranquilizadora de Vera para sua mãe, D. Maria, interpretada com todas as nuances devidas pela atriz Georgette Fadel. O ator Floriano Peixoto faz o médico, pai de Vera, também com todas as nuances de um pai “que não está entendendo nada” do que acontece.

Em O Mensageiro, a mensagem é precisa: “Perdoar não é esquecer”.

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