Agora o povo
Neste contexto, acreditamos que a Europa precisa de uma esquerda forte e combativa que não comprometa os seus valores e que lute por um projeto alternativo. Um projeto de justiça económica e social em que todos contribuam de acordo com o seu rendimento e em que a riqueza seja redistribuída.
A imprensa corporativa está alinhada com a direita em todos os países porque é propriedade dos grupos financeiros que dominam o sistema econômico. O jornalismo é apenas um negócio nesses países. Não abre seus espaços de noticiário ou de opinião aos movimentos de esquerda porque não são do interesse dos negociantes. Dedico, por esta razão, o espaço deste texto a um importante documento divulgado há pouco e que, ignorado pela imprensa tradicional, teve pouca repercussão.
O Bloco de Esquerda, de Portugal, França Insubmissa, Podemos, da Espanha, Partido da Esquerda da Suécia, Aliança da Esquerda da Finlândia e Aliança Vermelha e Verde da Dinamarca assinaram uma posição conjunta em defesa da solidariedade, do clima, da justiça e da paz.
Eis a íntegra dessa declaração:
Unidos pela Solidariedade, Clima, Justiça e Paz – Agora o Povo!
As crises que atingiram a Europa nos anos recentes agravaram as situações de emergência social e climática que já existiam. A explosão dos preços beneficiou um punhado de especuladores, aumentando as desigualdades e mergulhando mais famílias na precariedade. Os efeitos das alterações climáticas na Europa tornaram-se muito mais visíveis, com toda uma série de catástrofes climáticas: inundações, secas, incêndios… A pandemia de Covid demonstrou o subfinanciamento estrutural dos nossos serviços públicos, atacados por anos de privatização e austeridade, e os perigos de ainda mais deslocalizações e do comércio livre, que ameaçam a democracia, o ambiente e a nossa soberania.
Austeridade e privatizações
Estas crises demonstraram, uma vez mais, o absurdo e a perigosidade dos atuais tratados neoliberais europeus e que o rumo seguido pela UE nos conduz diretamente contra uma parede. Apesar disso, e depois de terem reconhecido a ineficácia das suas regras, os líderes da União Europeia mantêm-se obstinadamente fiéis a uma lógica ultraliberal baseada na austeridade, nas privatizações, num sistema de mercado total e de acordos de comércio livre, colocando os interesses corporativos à frente dos direitos dos povos e dos trabalhadores. A Europa está numa encruzilhada e chegou o momento de decidir se queremos persistir nesta lógica brutal e perigosa ou transformar radicalmente o nosso sistema, pondo fim à austeridade, reforçando os nossos serviços públicos, implementando um verdadeiro planejamento ecológico e assegurando que a transição responsabilize os grandes poluidores, beneficie todos e não deixe ninguém para trás.
O resultado das suas políticas é claro: conduzem ao sofrimento e à destruição e abrem o caminho ideal para que a extrema-direita faça avançar as suas ideias e o seu discurso de ódio. Num número crescente de países, a extrema-direita está no governo ou às portas do poder: esta tendência deve fazer-nos soar o alarme. Em toda a Europa, isto é sinónimo de um desafio dramático ao Estado de direito, ao pluralismo dos meios de comunicação social e às liberdades democráticas. Leva ao enfraquecimento dos direitos das mulheres, das pessoas LGBTQIA+ e das pessoas com deficiência, mas também das comunidades migrantes e racializadas, que são os principais alvos da extrema-direita. Esta tendência anda de mãos dadas com uma flagrante falta de solidariedade, particularmente com aqueles que fogem dos seus países em direção à UE. Juntos, temos de lutar pela democracia e resistir à cultura do ódio e do medo, não deixando espaço para o fascismo em qualquer das suas formas.
Ucrânia, Palestina
Num mundo marcado por tensões, conflitos e pela erosão do direito internacional, a atual trajetória é alarmante. A inaceitável guerra de agressão da Rússia contra a Ucrânia mostrou que a paz e o respeito pelo direito internacional nunca podem ser tomados como garantidos. As tropas russas devem retirar-se da Ucrânia e a UE deve garantir que o direito internacional seja respeitado nas conversações de paz. Entretanto, temos de mostrar solidariedade para com a Ucrânia, nomeadamente através de estratégias de cancelamento da dívida para ajudar a reconstruir o país.
Quanto à ocupação ilegal da Palestina por Israel, esta persiste há décadas, desrespeitando de forma flagrante o direito internacional e desafiando inúmeras resoluções das Nações Unidas. Desde 7 de outubro, a violência tem vindo a aumentar, com os horrendos ataques do Hamas e os bombardeamentos indiscriminados de Gaza por parte de Israel, provocando a morte de milhares de pessoas. Todas as vidas são valiosas, e o nosso objetivo incessante é garantir um cessar-fogo imediato, libertar os reféns e levantar o bloqueio, uma vez que a privação de fornecimentos vitais, incluindo água, alimentos e eletricidade, representa um crime de guerra. Em seguida, temos de assegurar uma paz duradoura para todos os que são afetados por este conflito persistente e promover uma solução de dois Estados que garanta a segurança tanto dos israelitas como dos palestinianos. Neste cenário internacional turbulento, mantemo-nos firmes no nosso objetivo de promover a paz, defender a justiça e garantir a segurança e o bem-estar de todos.
Neste contexto, acreditamos que a Europa precisa de uma esquerda forte e combativa que não comprometa os seus valores e que lute por um projeto alternativo. Um projeto de justiça económica e social em que todos contribuam de acordo com o seu rendimento e em que a riqueza seja redistribuída. Um projeto que combata verdadeiramente o aquecimento global e as suas graves consequências e que proteja a natureza, apoiando simultaneamente as pessoas da classe trabalhadora na transição. Um projeto em que as regras de austeridade deixem de impedir o investimento na transição ecológica e nos serviços públicos que devem ser protegidos da concorrência e da lógica de mercado. Um projeto em que o feminismo e a luta pela igualdade e contra o patriarcado sejam transversais e estejam presentes em todas as esferas da sociedade. Um projeto onde a democracia seja aprofundada, onde os nossos direitos e liberdades prevaleçam e onde as minorias e os refugiados ganhem novos direitos.
Acreditamos firmemente que outro caminho está ao nosso alcance e faremos todos os esforços para lá chegar, ao lado de sindicatos, ONGs, movimentos sociais e organizações da sociedade civil para falar com uma voz clara: a voz dos trabalhadores, de todos os que ficaram para trás e daqueles que querem lutar pelo planeta. É com esta vontade e força coletiva que faremos campanha juntos para as próximas eleições europeias. Juntos, construiremos uma Europa que defenda os interesses de muitos, não de poucos.
Poeta, articulista, jornalista e publicitário. Traballhou no Diário de Minas como repórter, na Última Hora como chefe de reportagem e no Correio de Minas como Chefe de Redação antes de se transferir para a publicidade, área em que se dedicou ao planejamento e criação de campanhas publicitárias. Colaborou com artigos em Carta Maior e atualmente em Fórum 21. Mora hoje no Porto, Portugal.
É autor de Poente (Editora Glaciar, Lisboa, 2022), Dezessete Poemas Noturnos (Alhambra, 1992), O Último Número (Alhambra, 1986), O Itinerário dos Emigrantes (Massao Ohno, 1980), A Região dos Mitos (Folhetim, 1975), A Legião dos Suicidas (Artenova, 1972), Processo Penal (Artenova, 1969) e Texto e a Palha (Edições MP, 1965).