Extrema-direita e neofascismo
A análise do perfil psicológico de um indivíduo, incluindo quem adota ideologias políticas específicas, é complexa e não pode ser generalizada. O fascismo é uma ideologia política com capacidade de envolver indivíduos com características autoritárias, nacionalistas e antiliberais, mas não há um “perfil psicológico típico” aplicável a todos os seus adeptos.
A adesão a ideologias autoritárias, como o fascismo, é influenciada por uma variedade de fatores, incluindo predisposições psicológicas individuais, experiências de vida e o contexto sociopolítico. Geralmente, indivíduos com tendência a se inclinar à direita, para ideologias exclusivistas, foram educados (ou forçados a sentir) necessidade de ordem e segurança.
Essas pessoas costumam se amparar em um forte controle social e ordem segura, muitas vezes em resposta a ansiedades percebidas diante das dificuldades de segurança pessoal. Daí são atraídas por ideologias ordeiras com imposições ditatoriais.
Com baixo nível escolar, ou adotam um conformismo com a própria ignorância ou têm tendência a aderir a normas sociais estabelecidas e oferecer resistência à diversidade de opiniões. Sem serem dotados de conceitos científicos, ficam a um passo de adoção de preconceitos e atitudes discriminatórias em relação a grupos considerados diferentes, alimentando uma visão hierárquica da sociedade a partir do macho hétero branco.
Demonstram tremenda intolerância à ambiguidade, dadas suas dificuldades em lidar com situações complexas multifatoriais. Buscam soluções simplistas: “matar o inimigo”.
No caso brasileiro, têm identificação com alguma autoridade forte, armada como os militares ou os milicianos, vindos de Polícia Militar. A tendência é seguir líderes armados e autoritários, em busca de direção “certa” e segurança.
“Patriotários” justificam tudo isso com demonstração de um nacionalismo extremo: vestir a camisa-amarela (da corrupta CBF) e sair por aí, inclusive vandalizando os três Poderes da República… O discurso de forte identificação com a própria nação brasileira está associado a uma visão exclusivista e/ou xenofóbica a ponto de polarizar Sul-Centro-Oeste contra Nordeste.
Como já dito, estas são tendências gerais e não características definitivas de todos os direitistas, mesmo porque muitos não sabem sequer serem de extrema-direita ao considerar os seres humanos desiguais – e quem não for parecido consigo merecer o extermínio. Além desses valores, o contexto sociopolítico, experiências de vida e outros fatores desempenham papéis significativos nas crenças e comportamentos das pessoas.
A análise do comportamento humano e das motivações políticas é complexa por ser multifatorial. A compreensão de indivíduos deve levar em consideração a diversidade e as nuances da psicologia humana. Qualquer generalização excessiva arrisca a levar a estigmatização e uma simplificação indevida de questões individuais complexas.
Seria social e politicamente saudável, quem se diz seguidor de um sujeito desqualificado para ser um líder admirável saber mais a respeito do neofascismo. Ele é a herança maldita dos “órfãos (admiradores) do nazifascismo”, porque é uma ideologia pós-Segunda Guerra Mundial, a qual recorre ao voto para ascender e, depois, não aceita a derrota eleitoral.
O neofascismo, geralmente, inclui nacionalismo, nativismo, anticomunismo e oposição à República com Três Poderes e à democracia. É uma manifestação do extremismo de direita, sendo esse um termo coletivo para ideologias e atividades políticas fascistas, neonazistas ou ultranacionalistas.
Todos esses sujeitos se orientam pela filiação étnica e representam uma compreensão antipluralista, antidemocrática e autoritária da sociedade. Os “neofascistas” aderem a movimentos, ideias ou comportamentos com muitas semelhanças com o fascismo original, mas surgidos em contextos contemporâneos, após a Grande Crise Financeira (GCF de 2008), em reação a movimentos sociais identitários contra seus valores.
O termo, portanto, é usado para descrever elementos políticos, ideológicos ou sociais com compartilhamento de características ou traços comuns ao fascismo histórico, mas manifestados em contextos mais recentes. O fascismo original, especialmente associado aos regimes liderados por figuras como Benito Mussolini na Itália e Adolf Hitler na Alemanha, durante a primeira metade do século XX, era uma ideologia autoritária, nacionalista, antidemocrática e caracterizada por tendências totalitárias, ultranacionalistas e antiliberais.
O prefixo “neo” em “neofascista” indica uma forma contemporânea ou uma ressurgência de características semelhantes, mas não necessariamente idênticas, a esse fascismo histórico. Os movimentos ou ideias neofascistas se manifestam de maneiras diversas, entre as quais, com nacionalismo extremo, autoritarismo, xenofobia, intolerância – e a rejeição de valores democráticos e liberais.
Evidentemente, algumas pessoas interpretam os eventos ou movimentos políticos recentes de maneira diferente. A aplicação do termo varia de acordo com o contexto político, cultural e histórico específico. Há semelhanças discerníveis com o fascismo, mas não implica uma cópia exata dele, apesar de haver de comum com Hitler e Mussolini o fato de ser eleito – e depois não aceitar nenhuma derrota ou alternância de poder.
A polarização política no Brasil envolve muitos fatores. Porém, os valores morais e religiosos têm desempenhado um papel proeminente nesse fenômeno.
A sociedade brasileira é diversa em termos de crenças, valores culturais e religiosos. Logo, a ignorância dos esnobes conservadores destaca as divergências nessas áreas e tem contribuído para uma polarização acentuada.
Disputas sobre questões morais e valores culturais, especialmente, relacionadas a temas como aborto, casamento LGBT+, educação sexual, entre outros, têm gerado divisões significativas. Pior, muito disso se deve à intolerância religiosa: tensões entre diferentes grupos religiosos têm sido observadas, especialmente quando se trata de discussões sobre liberdades individuais e direitos civis.
Por exemplo, na recente pesquisa Quaest (19/12/23), a amostra era composta por 46% católicos, 30% evangélicos e 18% sem religião, somando outros 6%. Na nota atribuída ao primeiro ano do governo Lula III, pelos diferentes perfis, a média mais baixa (5,2) é dada por evangélicos, moradores do Sul e acima de 5 salários-mínimos de renda.
A polarização política, além de valores, também está associada a diferenças ideológicas, econômicas e sociais, com diferentes grupos políticos defendendo abordagens distintas para questões fundamentais. Como exemplo, a desconfiança nas instituições políticas e a percepção de corrupção ainda têm alimentado a polarização, com diferentes grupos continuando a atribuir responsabilidades a partidos políticos específicos – e não ao lava-jatismo ilegal. Assim, cultivam os contrapontos entre o antipetismo e o antifascismo.
O papel dos meios de comunicação e das redes sociais, na disseminação de falsas informações e na formação de bolhas/câmaras de econômico, amplia as divisões. Criam ambientes onde opiniões são reforçadas sem exposição adequada ao contraditório.
A história política e social do Brasil, incluindo eventos como impeachment/golpe semiparlamentarista, crises econômicas e escândalos políticos, ainda contribui para a polarização. Moldam a forma como diferentes grupos percebem o ambiente político.
A polarização política é multifacetada. Diferentes regiões do Brasil forçam polarizações, porque habitantes de algumas se acham superiores, ao se imaginarem self-made-men: sem EMBRAPA-BB-BNDES?! O diálogo construtivo, o respeito às diferenças e a busca por consensos são importantes, em um contexto polarizado, para construir uma sociedade brasileira mais coesa e inclusiva.
Extremismo de direita é um termo coletivo para designar uma ideologia nefasta, cujo núcleo comum é a supervalorização da etnia, o questionamento da igualdade de todas as pessoas e uma compreensão não plural e autoritária da sociedade. O uso de teorias da conspiração substitui, em grupos de rede social com compartilhamento da ignorância comum, uma análise racional das mazelas sociais.
Elas servem tanto para aliviar quanto para integrar grupos de extremistas de direita. Além disso, as teorias da conspiração são usadas para criar ligações históricas ao fascismo e ao nazismo, com base no chamado revisionismo histórico.
O anacrônico anticomunismo, sem justificativa desde 1991, é repaginado pelos militares e familiares. Afinal, foram doutrinados durante a Guerra Fria até o fim da URSS, daí transpõem esse sentimento ao antipetismo por o PT ser adepto do igualitarismo social.
Os neofascistas ou os extremistas-de-direita não aceitam a democracia eleitoral com a alternância de poder decidida pelos votos. Tampouco aceitam a mobilidade social com um reformismo gradualista, propiciado por políticas públicas afirmativas e compensatórias da dívida social, acumulada com os descendentes dos escravos e os nativos desde a colonização pelo homem branco de origem europeia. Só.
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Fernando Nogueira da Costa é professor titular do Instituto de Economia da UNICAMP. Obras (Quase) Completas em livros digitais para download gratuito em http://fernandonogueiracosta.wordpress.com/). E-mail: fernandonogueiracosta@gmail.com.