Eleições expõem panorama político e ambiental no Equador
Luisa González, líder do movimento Revolução Cidadã, do ex-presidente Rafael Correa, ficou em primeiro lugar nas eleições presidenciais de 20 de agosto no Equador, mas terá que disputar um segundo turno em 15 de outubro contra o empresário Daniel Noboa
Por Correspondente da IPS
QUITO – A centro-esquerdista Luisa González e o empresário conservador Daniel Noboa disputarão a presidência do Equador em 15 de outubro, de acordo com os resultados do primeiro turno eleitoral, no qual a população também decidiu, por meio de referendo, proibir a mineração em duas áreas de rica biodiversidade.
González, advogada de 45 anos, mãe de dois filhos, ex-parlamentar, líder do movimento Revolução Cidadã do ex-presidente Rafael Correa – que está autoexilado na Bélgica – e que ocupou vários cargos em seu governo (2007-2017), obteve 3,1 milhões de votos (33,3%).
Acompanhada pelo candidato a vice-presidência Andrés Araúz, que foi o candidato presidencial do partido nas eleições de 2021, González comemorou sua alta votação e disse que “o voto do país que busca paz, medicamentos e empregos se tornou evidente”.
Noboa, empresário de 35 anos, filho do magnata do camarão Álvaro Noboa – que buscou a presidência, sem sucesso, em cinco ocasiões – surpreendeu ao ficar em segundo lugar, com 2,2 milhões de votos (24%) pelo seu partido Ação Democrática Nacional (ADN), uma vez que as pesquisas anteriores o colocavam em quarto ou quinto lugar.
“Não será a primeira vez que um novo projeto desafia o ‘establishment’ político”, disse Noboa ao iniciar a campanha para outubro, recebendo o imediato apoio de Jan Topic, outro empresário que fez campanha com foco rígido na criminalidade e obteve o quarto lugar ao receber 1,3 milhão de votos (14%).
No terceiro lugar ficou Christian Zurita, substituto de Fernando Villavicencio, que baseou sua campanha em denúncias de corrupção e foi assassinado por um pistoleiro em 9 de agosto. O partido recebeu 1,5 milhão de votos (16%).
O assassinato de Villavicencio pareceu marcar o auge da atividade criminosa que mantém grande parte da população em um clima de medo e insegurança, e vários candidatos foram aos locais de votação protegidos com capacetes, coletes à prova de balas e fortes escoltas.
O atual presidente, o conservador Guillermo Lasso, dissolveu o parlamento por meio do mecanismo constitucional de “morte cruzada”, que era muito adverso a ele, e convocou eleições antecipadas para completar seu mandato – sem se apresentar como candidato. Portanto, o novo mandatário governará apenas por 18 meses.
Neste 20 de agosto, também foi eleito um novo parlamento (unicameral), com 39% dos votos para a Revolução Cidadã, um segundo lugar destacado (20%) para o Movimento Constrói, alcançado com o chamado “voto de pesar” para Zurita, e um terceiro lugar (14%) para o ADN de Noboa.
A eleição reacende a confrontação entre as correntes de esquerda e direita do espectro político, bem como as propostas para lidar com a crise social marcada pelo aumento da criminalidade e uma taxa de pobreza de mais de 20% nas cidades e o dobro nas áreas rurais.
No ano passado, houve 4600 mortes violentas no país, que tem 18 milhões de habitantes – contra 890 em 2019 – e, até o momento de 2023, já foram registradas 3600. Desde 2020, os massacres em prisões causaram mais de 400 mortes, e organizações internacionais de crime organizado e tráfico de drogas atuam no país.
Exploração petrolífera no Parque Nacional Yasuní, no nordeste do Equador, que faz parte da Amazônia e deve ser desativada em um ano, pois os equatorianos decidiram em referendo manter o petróleo no subsolo para proteger a rica biodiversidade da área. Imagem: MEM Equador
Referendo verde
Mas o dia 20 de agosto trouxe, juntamente com a eleição democrática de uma nova liderança política, o pronunciamento da população sobre a escolha entre desenvolver a mineração e os hidrocarbonetos para aumentar a receita fiscal e de alguns setores econômicos, ou sacrificar esses interesses em prol da natureza.
A primeira consulta, solicitada por ecologistas e adiada por uma década até ser autorizada pelo Tribunal Constitucional este ano, perguntou à população se deveria proibir a exploração petrolífera nos campos ITT (Ishpingo, Tambococha e Tiputini), que fazem parte do Bloco 43, no Parque Nacional Yasuní, no nordeste amazônico.
À pergunta se concordavam que o governo deveria manter esses recursos petrolíferos no subsolo indefinidamente, 59% dos equatorianos disseram Sim e 41% responderam Não.
O Parque Nacional Yasuní é uma das regiões mais biodiversas do mundo, com um milhão de hectares que abrigam mais de 2000 espécies de árvores e arbustos, 204 de mamíferos, 610 de aves, 121 de répteis, 150 de anfíbios e mais de 250 de peixes.
A área é habitada pelos povos indígenas tagaeri e taromenane, que vivem em isolamento, e desde 1989 a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura a declarou reserva mundial da biosfera.
De acordo com a decisão do Tribunal, a pedido do movimento ambientalista Yasunidos, as instalações dentro do Bloco 43-ITT devem ser desativadas em um prazo de um ano. Atualmente, produzem cerca de 55.000 barris (de 159 litros) de petróleo por dia, o que representa 11% das 480.000 unidades produzidas pelo Equador.
Com um produto interno bruto de 105 bilhões de dólares por ano, o petróleo é a principal fonte de exportação e renda do Equador, seguido pela exploração de camarões e cultivos como banana.
Outro referendo, restrito apenas aos eleitores da área metropolitana da capital, perguntou se autorizariam a exploração mineira no Chocó Andino, uma área protegida de 250.000 hectares na província de Pichincha, noroeste de Quito.
Assim como o Yasuní, a reserva se destaca por sua grande biodiversidade, com a presença de 270 espécies de mamíferos, 210 de répteis, 130 de anfíbios e 227 variedades de orquídeas, e já havia recebido uma dúzia de concessões de mineração para a exploração de cobre, ouro e prata.
A população foi consultada se concordava em proibir a mineração na área, com quatro perguntas para as diferentes escalas de exploração (artesanal, pequena, média ou grande mineração), e as respostas foram todas em torno de 68,5% a favor da proibição e 31,5% contra, uma clara manifestação em favor da conservação.
*Imagem em destaque: Imagem: Comando de campanha/RC
**Publicado originalmente em IPS – Inter Press Service | Tradução de Marcos Diniz
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