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Populismo de Direita: Xenofobismo nos EUA e Reacionarismo no Brasil

Populismo de Direita: Xenofobismo nos EUA e Reacionarismo no Brasil

Os gastos públicos aumentarão, porque o envelhecimento levará a mais pensões e maiores custos médicos e de assistência social, justamente, enquanto o crescimento da renda real e a capacidade tributável estarão diminuindo. Há possíveis formas de aumentar as receitas fiscais, de maneira progressiva, mas as elites resistirão.

A formulação de políticas públicas se tornará muito mais difícil se estiverem corretos os coautores, Charles Goodhart e Manoj Pradhan, do livro lançado em 2020, The Great Demographic Revival. Os custos salariais e a inflação começarão a se elevar.

A opinião de isso ter possibilidade de acontecer é contestada pelo argumento da substituição. O efeito da China de produzir bens comercializáveis a preços baixos para o consumo mundial, mantendo assim a inflação e os custos salariais baixos em outros lugares, poderia passar para a Índia e África, onde a evolução demográfica permanece altamente favorável.

Também há a possibilidade de aumentar as taxas de participação entre os idosos e a inovação com automação/robótica/IA como forma de compensar a desaceleração da força de trabalho. Então, para concluir o livro, os coautores se perguntam: quais são as implicações do diagnóstico deles para as políticas fiscais e as taxas de juros reais?

A formulação de políticas econômicas é sempre difícil. Mas se a versão do futuro, apresentadas por eles, estiver correta, em breve se tornará ainda mais difícil.

Os gastos públicos aumentarão, porque o envelhecimento levará a mais pensões e maiores custos médicos e de assistência social, justamente, enquanto o crescimento da renda real e a capacidade tributável estarão diminuindo. Há possíveis formas de aumentar as receitas fiscais, de maneira progressiva, mas as elites resistirão.

Nas últimas décadas, dizem Goodhart e Pradhan, no mundo rico, os Bancos Centrais foram os melhores amigos dos Ministros da Fazenda. Baixaram as taxas de juros para aliviar as pressões fiscais e estabilizar os índices de serviço da dívida pública.

Quando as pressões inflacionárias recomeçarem, como esperam, essa harmonia anterior se reverterá em hostilidade mútua? O Banco Central tentará defender sua meta de inflação, enquanto os políticos quererão crescimento mais rápido e serviços da dívida mais baixos? Podemos adivinhar quem vai ganhar no Brasil… e no exterior?

Se lá os políticos vencerem, como esperam os autores citados, as taxas de juros reais permanecerão baixas, porque as taxas de inflação subirão além da alta das taxas de juros nominais. Vice-versa ocorrerá se os Bancos Centrais dominarem o cenário.

Mesmo caso os políticos se imporem, Goodhart e Pradhan duvidam de os Bancos Centrais simplesmente se retirarem sem lutar por suas metas de inflação. Acreditam nelas, por mais irrealistas sejam elas, como as atuais no Brasil frente ao cenário internacional. Inevitavelmente, isso trará um período de incerteza política e volatilidade.

O pensamento econômico dominante pressupõe tanto a dívida quanto o envelhecimento manterem as variáveis nominais e reais nos níveis mais baixos. Goodhart e Pradhan veem esses dois fatores, demografia e dívida, mais em conflito em lugar de fazerem aliança.

Enquanto a reversão na demografia começa a pressionar a inflação e as taxas de juros para cima, economias e/ou setores com dívidas insustentáveis, por exemplo, o varejo brasileiro, serão, um a um, intimidados à submissão.

O choque da dívida, sem dúvida, criará períodos de crescimento mais fraco e até recessões ou crises. Esses períodos também gerarão inflação e taxas de juros mais baixas ciclicamente.

No entanto, sob essas desacelerações cíclicas, a inflação e as taxas de juros ressurgirão, estruturalmente, para remover o obstáculo do endividamento de seu caminho. Quando exatamente essas batalhas serão travadas, vencidas ou perdidas, é impossível dizer algo com certeza a respeito do futuro, resultante de múltiplas decisões descentralizadas, descoordenadas e desinformadas umas das outras.

Faz algum sentido, tendo apoiado a atividade econômica de maneira tão ampla, no ano da pandemia, deixar grande parte dessa mesma economia “ir para o buraco”, nos anos seguintes, como resultado do aumento das taxas de juros e da contenção fiscal? Para Goodhart e Pradhan, o lobby dos empréstimos (governo, indústria, endividados) é muito mais poderoso politicamente em comparação ao lobby da poupança.

Mas, dizem, para tal aumento na inflação ser (rapidamente) interrompido, a renda real de algumas pessoas precisará sofrer. Quem pode ser “a vítima”?

A renda real do trabalhador comum ficou bastante estagnada nos últimos 30 anos. Goodhart e Pradhan atribuem isso ao enorme choque positivo de oferta de trabalho, causado pela globalização e efeitos demográficos favoráveis.

Isso permitiu os empregadores ameaçarem de transferir empregos para a Ásia ou para migrantes sem direitos, caso chegassem ao território nacional, exceto caso os trabalhadores moderassem suas demandas. Esta foi vista como uma ameaça crível.

Espera-se ter sido ultrapassada a ameaça sobre os trabalhadores do mundo rico justificadora da eleição de políticas do tipo Trump, populismo de direita e barreiras à migração. Após o passo eleitoral em falso, o equilíbrio do poder de barganha passou, devido às tendências demográficas, a voltar para os trabalhadores, afastando-se dos empregadores. As tendências políticas atuais mais socialistas reforçam isso.

Após a recuperação do poder de barganha, caso isso de fato acontecer, as tendências salariais mudarão. A probabilidade é as demandas salariais corresponderem, ou talvez até excederem, a inflação atual, apesar dos inevitáveis apelos por moderação no contexto de um “ponto temporário” na inflação.

A análise de Goodhart e Pradhan sobre os efeitos políticos da globalização e das tendências demográficas, nas três últimas décadas, padece de um certo economicismo. Os ex-operários nos EUA teriam perdido a esperança de melhoria no bem-estar econômico próprio e dos seus descendentes – e ficaram ressentidos. O nacionalismo xenófobo contra a globalização e a concorrência de estrangeiros angariou seus votos.

Votaram em MAGA (Make America Great Again) contra a terceirização da produção manufatureira para países de baixo custo da mão-de-obra. Apoiaram o discurso de ódio contra a concorrência de imigrantes, ocupantes de empregos não qualificados. Os eleitores ressentidos votaram contra o establishment por a elite com Ensino Superior não responder às suas preocupações laborais em vez de resgatar bancos após a GCF…

Aqui, no Brasil, o populismo de direita não explorou esse falso nacionalismo, mas sim os sentimentos dos evangélicos contra a pauta identitária da esquerda e dos ressentidos interioranos/ruralistas contra a elite universitária, cosmopolita ou metropolitana.

Aproveitou-se do preconceito contra “elites oportunistas, capazes de operar os mecanismos de representação para se perpetuarem no poder”. A representação verdadeira pelo líder messiânico traria uma reaproximação com a identidade autêntica do povo, impondo a eliminação das distorções produzidas pelos agentes dos interesses das elites, tais como a imprensa, o lobby econômico, o corporativismo da classe política, as organizações da sociedade civil, os partidos tradicionais etc.

Por “populismo”, no livro “O Populismo Reacionário: Ascensão e Legado do Bolsonarismo” (2022), Christian Lynch e P. H. Cassimiro designam um estilo de fazer política praticado por uma liderança identificada como autêntica e capaz de reivindicar para si a representação de uma eventual maioria dos eleitores contra o restante da sociedade. Esse “povo”, concebido como um singular coletivo, formado por indivíduos diferentes, é tratado como fosse uma entidade homogênea dotada de vontade própria.

O populista se apresenta como intérprete privilegiado de suposta vontade conservadora do “povo”, antes negligenciada ou impedida na democracia liberal por uma minoria ou elite. Esta monopolizaria os recursos políticos, sociais e econômicos de poder.

Entretanto, esse discurso pretensamente unificador é desmitificado por dados da pluralidade política brasileira. Pesquisa Datafolha, em 6/4/23, aponta: 30% dos eleitores se dizem petistas e 10% se consideram mais próximos ao petismo, enquanto 22% se definem como bolsonaristas junto a outros 9% mais próximos do bolsonarismo, ou seja, 40% contra 31%. Neutros são 22% e 7% se colocam fora desse duelo.

As regiões com mais pessoas petistas são Nordeste (42% X 14%) e Sudeste (27% X 22%). Perdem no Sul (21% X 28%) e empatam no Centro-Oeste/Norte (29% X 30%). Superam os bolsonaristas entre pessoas com ensino fundamental (40% X 23%), ensino médio (28% X 22%) e ensino superior (21% X 20%). Também na faixa de renda até dois salários mínimos (39% X 19%). Os petistas perdem na classe média de 2 a 5 SM (21% X 23%) e 5 a 10 SM (14% X 32%), mas superam os bolsonaristas na faixa acima de 10 SM (19% X 16%). A parcela petista entre os católicos é de 36%, frente a 19% identificados como bolsonaristas. Entre evangélicos, bolsonaristas são 29%, enquanto 23% se definem como petistas. Não dá para generalizar e estigmatizar os sulistas (28%) e os evangélicos (29%) como bolsonaristas. Estes ressentidos comem angu e arrotam peru

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