Até quando a humanidade caminhará para a autodestruição?
Adroaldo Quintela
Não farei uma prece para a chuva intermitente parar. Semana de calor insuportável. A chuva chegou para dar um refresco. A brisa fria é preciosa. Viva a chuva na boca do inverno na Bahia.
São terríveis as chuvas torrenciais como as que ainda causam enchentes, mortes, doenças e perdas irreparáveis na maioria dos municípios do Rio Grande Sul. Impossível perceber à distância o sofrimento da população atingida. Toda a minha solidariedade aos desabrigados e desamparados gaúchos.
Oxalá a magnitude das enchentes – as perdas irreparáveis de entes queridos, animais de estimação e bens patrimoniais, assim como as repercussões em termos de saúde física e mental – acordem as autoridades locais e nacionais para se conscientizarem de que as mudanças climáticas chegaram pra valer. Impossível e irresponsável continuar com belos discursos e fazendo mais do mesmo.
Em 2012, por ocasião dos preparativos e realização da Conferência Rio+20, o consenso hegemônico era de que “as mudanças climáticas, caracterizadas por fenômenos naturais extremos atingiria as gerações futuras, se nada fizéssemos para reduzir o aquecimento global”.
Atualmente os desastres ambientais estão acontecendo com frequência inimaginável há 4 anos ou menos. A pergunta é: nossas políticos e técnicos continuarão virando a cara para as consequências do aquecimento global?
Enfim, não levamos a sério os alertas dos cientistas. Pouco fizemos para reduzir o aquecimento da mãe terra. O que aconteceu? A natureza está reagindo mais cedo do que prevíamos. Secas e enchentes ocorrem com frequência impensável. Perguntas que não me fazem calar: os políticos continuarão fazendo mais do mesmo? Até quando a humanidade caminhará para a autodestruição?
Choveu muito no mês passado em Salvador. Mais do que o dobro da média histórica para meses de abril, segundo os institutos de meteorologia. A Prefeitura de Salvador está fazendo muita propaganda sobre a preparação da cidade e da defesa Civil para enfrentar as enxurradas provocadas pelas chuvas.
No entanto, por dever de ofício – sou economista com especialização em planejamento regional e urbano – questiono: a cidade de cimento, asfalto, viadutos arranha céus está verdadeiramente preparada para temporadas chuvas no volume do que ocorreu na Serra Gaúcha e Porto Alegre? A propalada resiliência de Salvador e os sistemas de avisos de catástrofe serão suficientes para aguentar a virulência das águas sem provocar tragédias irreparáveis?
Sinceramente, não acredito. É preciso plantar mais árvores, reduzir a especulação imobiliária e parar de encher as vias públicas com mantas de asfalto. Chegou a hora de pensarmos em construir um projeto de cidades-espumas nas áreas alagáveis de Salvador, especialmente na Cidade Baixa. Se a Prefeitura e o Governo do Estado (por meio da Conder) não mudarem o padrão da intervenção urbana em Salvador, não demorará muito tempo para vermos o Mercado Modelo invadido pelas águas. Há que lembrar que as águas da Baía de Todos os Santos, lambiam as escadarias da Igreja de Nossa Senhora da Conceição da Praia, antes do aterro e da construção do Porto de Salvador.
*Adroaldo Quintela, economista e fundador da Associação Brasileira de Economistas Pela Democracia (Abed), diretor-executivo do Instituto de Desenvolvimento Sustentável do Nordeste Brasileiro (IDENE)