Giro na Europa: Lula embarca nesta noite para Portugal
Nos principais jornais internacionais, as expectativas da viagem de Lula a Portugal e seu giro pela Europa, quando deve se manifestar sobre temas quentes como a Guerra na Ucrânia e o acordo UE-Mercosul. Sobre a política interna, a demissão do ministro do Gabinete de Segurança Internacional, Gonçalves Dias.
POR MATEUS FORLI E TATIANA CARLOTTI
O jornal português Expresso e o argentino Clarín noticiaram a antecipação da ida de Lula a Portugal e seu giro pela Europa, quando o presidente brasileiro deve se manifestar sobre temas quentes como a Guerra na Ucrânia e o acordo UE-Mercosul.
A expectativa é de uma modulação no seu discurso sobre a guerra, com vistas a neutralizar as preocupações aventadas por altos-funcionários da UE envolvendo o referido acordo comercial, tema do Focos 21 de ontem.
Saindo do Brasil na noite de hoje (20), a chegada de Lula a Lisboa é esperada para a manhã de sexta-feira (21). Lula fará um discurso no Parlamento português, em meio à grita de parlamentares do Chega, partido de extrema-direita do país, que anunciou que prepara uma manifestação por ocasião da presença do presidente brasileiro na tradicional comemoração da Revolução dos Cravos, em 25 de abril.
A viagem de Lula à China – que buscou, com sucesso, aproximar o Brasil da potência asiática – e as suas declarações por uma paz negociada entre Rússia e Ucrânia e contra o envio de armas para o conflito geraram desconforto entre altos-funcionários da UE e dos EUA.
Nesta senda, o Secretário-Geral do Partido Comunista Português, Paulo Raimundo, saiu em defesa do presidente brasileiro, afirmando ao jornal Expresso “não entender como as afirmações de Lula pela paz criaram embaraço”.
“Se há coisa que o 25 de abril acabou foi com a guerra e abriu os caminhos da paz para o país”, disse o dirigente comunista, acrescentando que o presidente Lula apenas reforçou a necessidade de se encontrarem “os caminhos para a paz” – o que certamente não passa pelo envio de armas ao conflito.
Ainda, conforme noticiado no Expresso, o presidente da Assembleia da República de Portugal, Santos Silva, afirmou não haver “nenhum problema” com a ida de Lula ao parlamento no dia 25 de abril, reforçando a tradição diplomática portuguesa de recepção de chefes de Estado estrangeiros no parlamento.
Ainda sobre as declarações de Lula sobre a Guerra na Ucrânia, no Clarín, Aníbal Pérez Liñán, professor de Ciência Política e Assuntos Globais na Universidade de Notre Dame, disse que os episódios recentes “podem arrefecer a relação entre os Estados Unidos e o Brasil”, mas, ao mesmo tempo, o especialista considera que “não é uma questão que defina a relação”.
O perito acrescentou que “o Brasil foi um pária no sistema internacional durante a presidência de Jair Bolsonaro. Em parte devido à questão ecológica, mas especialmente por causa do alinhamento de Bolsonaro com Trump. Lula está tentando recuperar uma posição de centralidade para o Brasil no sistema regional, no modelo BRIC. Primeiro com uma aproximação com os Estados Unidos e agora com este movimento com a Rússia. Ele quer posicionar o Brasil como um ator independente com uma certa capacidade de conversa, negociação e mediação entre os atores do sistema internacional”.
Em tempo: o portal Brazilian Report noticiou que a Casa Branca anunciou hoje que o Presidente Joe Biden irá pedir ao Congresso 500 milhões de dólares ao longo de cinco anos para “o Fundo Amazonas e atividades relacionadas no contexto do compromisso renovado do Brasil de pôr fim à desflorestação até 2030”. Em fevereiro, Washington fez uma oferta inicial de 50 milhões de dólares ao Fundo Amazonas.
A política doméstica brasileira também foi assunto nos principais veículos internacionais, em particular, devido a dois episódios: a demissão do ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), Gonçalves Dias, que aparece nas imagens internas do Palácio do Planalto, em 8 de janeiro, dia da intentona bolsonarista. O vídeo foi divulgado pela CNN Brasil.
Nas imagens, o então ministro do GSI permite a passagem dos manifestantes. Ele alega que sua presença não era desconhecida, que estava no local para proteger o prédio e retirar as pessoas dali. General da reserva do Exército, Dias atuou na segurança do presidente entre 2003 e 2010, e decidiu pedir demissão após a divulgação do vídeo. Quem assume o GSI interinamente é Ricardo Cappelli, assessor do Ministério da Justiça, responsável pela intervenção federal na segurança de Brasília, após os atos golpistas.
A notícia foi veiculada pela Agência Reuters, nos principais veículos do mundo, já com as declarações de Dias à Rede Globo nesta quarta-feira (19), quando afirmou que “as imagens divulgadas buscavam vinculá-lo a um capitão do exército que trabalhava para sua agência de segurança nacional que foi filmado distribuindo água aos invasores no palácio”. Ele acrescentou também “que o capitão e outros funcionários da agência foram afastados de seus cargos e estão sendo investigados por inquéritos internos e pelo Supremo Tribunal Federal”.
Como destaca The Washington Post. “membros da oposição reagiram às imagens dizendo que são evidências de que o governo Lula permitiu que os asseclas de Bolsonaro destruíssem prédios do governo uma semana após a posse do líder esquerdista para incriminá-los”.
No Guardian, Tom Phillips lembra que mais de 80 militares, incluindo agentes do GSI, já foram interrogados sobre os episódios de 8 de janeiro. No português Expresso, Manuela Goucha Soares avaliou o caso como “uma grave quebra de confiança na cadeia de comando, que remete para segundo plano a onda de choque que as suas declarações sobre a guerra da Ucrânia geraram no mundo ocidental”. O episódio também foi destaque no Clarín, com boa reportagem sobre o 8 de janeiro.
Outro tema doméstico com impacto, em particular nos veículos latino-americanos, foi a onda de ameaças e boatos de ataques em escolas brasileiras. O uruguaio El Observador traz, estabelecendo os paralelos com o caso brasileiro, a notícia de um adolescente de 13 anos preso após criar uma conta no Instagram, ameaçando realizar um massacre na UTU Nº 2 de Rivera, nesta quinta-feira.
No argentino La Nacion, as declarações de Lula sobre a segurança nos colégios e a polêmica em torno do uso descontrolado dos jogos eletrônicos: “quando tenho um filho de quatro anos chorando, o que faço por ele? Eu dou um tablet para ele brincar”, criticou.
No Correio da Manhã, reportagem de Domingos Grilo Serrinha cobre a onda de ameaças da última semana em São Paulo, lembrando que neste 20 de abril, completam-se 24 anos do massacre de Columbine nos Estados Unidos, quando “15 pessoas foram assassinadas em 1999, enquanto radicais do mundo inteiro comemoram o aniversário do ditador alemão Adolf Hitler, que nasceu em 20 de abril de 1889″.
Diz a reportagem que “em São Paulo, a maior cidade brasileira, onde duas semanas atrás um aluno de 13 anos matou uma professora e feriu outras três docentes e duas alunas, escolas e creches adotaram medidas de segurança mais rigorosas, recorrendo inclusive a guardas armados, o que especialistas não recomendam.
Por todo o país medidas similares foram tomadas e as autoridades das áreas de Educação e de Segurança Pública tentaram convencer os pais de estudantes de que as ameaças de massacres nesta quinta-feira não tinham qualquer fundamento e eram feitas somente para criar pânico, mas os pais que puderam evitaram levar os seus filhos para a escola; e outras nem abriram, ou abriram mas depois fecharam, porque os alunos não apareceram”, informa o jornal português.
Estudante de História e de Direito, um dos membros fundadores do movimento Geração 68 Sempre na Luta, faz parte da equipe executiva e da equipe de redação do Fórum 21 e produz, às quintas-feiras, o Focos 21