Cúpula do Mercosul: “Não queremos guerra na América do Sul”, afirma Lula
“Não precisamos de conflito. Precisamos construir a paz”, ponderou presidente brasileiro durante a 63ª Cúpula de Chefes de Estado do Mercado Comum do Sul (Mercosul), ocorrida nesta quinta-feira (7), no Museu do Amanhã, no Rio de Janeiro.
POR TATIANA CARLOTTI
‘Não queremos guerra na América do Sul’, afirmou o presidente Lula durante a 63ª Cúpula de Chefes de Estado do Mercado Comum do Sul (Mercosul), ocorrida nesta quinta-feira (7), no Museu do Amanhã, na região portuária do Rio. Para Lula, mediação do conflito entre a Guiana-Venezuela pela disputa da região de Esequibo, rica em petróleo e atualmente sob administração guianense, deve ser feita via CELAC e Unasul.
A declaração de Lula foi destaque em vários veículos internacionais e nacionais. Como aponta o francês Le Monde, o encontro que reuniu os presidentes Alberto Fernández (Argentina), Luis Alberto Lacalle Pou (Uruguai), Santiago Peña (Paraguai) e Luis Arce (Bolívia), novo integrante do bloco, acontece em meio ao crescimento das tensões na América Latina, e após o referendo venezuelano, promovido no último domingo (leia aqui).
O apelo de Lula acontece também no mesmo dia em que o Comando Sul dos EUA, que trata dos assuntos latino-americanos, realizou exercícios militares sobre a região de Essequibo. Na quarta (6), o departamento de Estado dos Estados Unidos informou que o secretário de Estado Antony Blinken havia conversado com o presidente guianense Irfaan Ali “para reafirmar o apoio inabalável dos Estados Unidos à soberania da Guiana”. O exercício militar desta quinta-feira, segundo nota do departamento de Estado, baseia-se “em compromissos e operações de rotina para melhorar a parceria de segurança entre os Estados Unidos e a Guiana e fortalecer a cooperação regional”, destaca La Nacion.
Em resposta, o ministro da Defesa da Venezuela, Vladimir Padrino Lópes, postou nas redes sociais: “Esta infeliz provocação dos Estados Unidos em favor da ExxonMobil na Guiana é mais um passo na direção errada. Alertamos que não seremos desviados de nossas ações futuras para a recuperação do Esequibo” (leia aqui).
Em sua fala nesta manhã, o presidente Lula pediu à Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (CELAC) que aborde ambos os lados sobre a realização de negociações. Afirmou ainda que o Brasil está pronto para ajudar. “Não precisamos de conflito. Precisamos construir a paz”, disse (leia aqui).
HELICÓPTERO ENCONTRADO
Nesta quinta, foi encontrado o helicóptero do Exército da Guiana, desaparecido ontem com sete pessoas a bordo, na fronteira da Venezuela. Segundo o chefe da Defesa daquele país, Omar Khan, a aeronave perdeu contacto “a 45 quilômetros da fronteira” entre os dois países, precisamente em Esequibo. O general já havia dito não haver dados que “sugiram” que a Venezuela esteja envolvida no caso. “O tempo estava ruim”, acrescentou ao La Nacion (leia aqui).
Já o Clarin destacou a presença militar do Brasil na região. “O exército brasileiro ordenou o aumento de seu contingente militar em Boa Vista, capital de Roraima, de 200 para 400. Além disso, a base militar desta cidade foi transformada em regimento de cavalaria com a chegada de 22 veículos blindados do modelo Guaicurus. Ao mesmo tempo, o contingente militar em Pacaraima, na fronteira com a Venezuela, passará de 30 para 130 militares”. Ao comentar o reforço, o ministro da Defesa, José Mucio Monteiro, declarou que “nossas fronteiras estão seguras e não permitiremos a passagem (de tropas venezuelanas) pelo Brasil” (leia aqui).
O tema também foi destaque no La Politica Online que lembra: “O Brasil tentou a mediação pessoal através de seu assessor e ex-ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, a quem enviou a Caracas para convencer Nicolás Maduro, mas a tentativa falhou e a consulta foi realizada de qualquer maneira” (leia aqui).
MERCOSUL-UE
Lula lamentou a não realização do acordo entre o Mercosul e UE. “Eu tinha um sonho que na minha presidência e na do meu colega (Pedro) Sánchez, nós conseguiríamos concluir [o acordo], acreditei que o povo merecia (…) Nunca na história do Mercosul, nós conversamos com tanta gente. Falei com todos os países, com os representantes” para tentar acelerar um acordo, que acabou não sendo alcançado devido, em sua visão, à “falta de flexibilidade” da UE, que “nos tratou como inferiores, como colonizados”. “Era inaceitável”, lamentou. Ele pediu ao presidente Peña (Paraguai), que assume a presidência pro tempore do bloco, que “nunca desista” de buscar um acordo, destaca La Nación (leia aqui).
Reportagem no inglês The Independent afirma que, sem este acordo, a cúpula do Mercosul decepciona. “O presidente esquerdista do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, é um defensor do acordo que está em andamento há duas décadas. Os seus principais parceiros até agora têm sido a Espanha, que detém a presidência da UE, e a Alemanha”, destaca o texto, lembrando que o acordo comercial significaria a integração “de um mercado de mais de 700 milhões de pessoas, cerca de 1/4 do PIB mundial e de 100 bilhões de dólares em comércio bilateral de bens e serviços por ano. Também reduziria os direitos aduaneiros e facilitaria o acesso dos exportadores agrícolas ao mercado da UE e dos fabricantes europeus aos países do Mercosul” (leia aqui).
Lula também falou sobre o acordo alcançado com Cingapura. Segundo a Reuters, enquanto o acordo com a UE fica suspenso, o Mercosul assina um acordo comercial e de investimento com Cingapura, o primeiro acordo desse tipo do grupo sul-americano em 12 anos, e o primeiro com um país asiático, (leia reportagem). Já o presidente Lacalle Pou apoiou a assinatura deste compromisso e reiterou a “vocação” do Uruguai para “fortalecer o Mercosul e também um acordo de livre-comércio com a China”, destaca a cubana Prensa Latina (leia aqui).
A Reuters também traz uma reportagem sobre a Argentina, destacando que diplomatas brasileiros disseram estar esperançosos que a Argentina, sob o comando de Milei, não vá deixar o bloco. “As economias do Mercosul totalizam 2,86 biliões de dólares em produto interno bruto e o comércio entre os quatro países aumentou dez vezes desde a sua criação em 1991″ (leia aqui).
La Nacíon, por sua vez, destaca que Lula não estará presente na posse de Milei, marcada para o próximo domingo (10), “embora tenha havido esforços para uma reaproximação, Lula não estará presente, em seu lugar chegará a Buenos Aires o chanceler do Brasil, Mauro Vieira” (leia aqui). Também estará ausente o presidente Joe Biden, dos Estados Unidos. Sobre a posse de Milei, o jornal argentino traz ainda a reportagem – “A viagem de Volodimir Zelensky à Argentina: a primeira visita à América Latina, após curto-circuito com Lula e a aposta em Milei” – com um longo histórico das relações entre Lula e Zelensky (leia aqui).
BNDES e NDB
Foi destaque no uruguaio El Observador a viagem do ex-presidente José Mujica ao Brasil, onde acompanhou o presidente Lula na assinatura de um contrato de empréstimo entre o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social do Brasil (BNDES) e o Novo Banco de Desenvolvimento (NDB), no Rio de Janeiro, nesta quarta-feira (6) (leia aqui).
PROTESTOS
Em meio as discussões da COP28 em Dubai, a Reuters reporta a reivindicação de mais de 1.500 trabalhadores das agências federais anti-desmatamento do Brasil por melhores salários e condições de trabalho. Segundo o texto, “as taxas de desflorestação na floresta amazônica brasileira caíram 50% nos primeiros 10 meses da presidência de Lula, mas os trabalhadores dizem que continuam mal pagos e sobrecarregados de trabalho enquanto Lula apregoa o seu sucesso na reunião de cúpula climática COP28 da ONU, no Dubai”. O chefe do Ibama, Rodrigo Agostinho, afirmou à agência britânica que “boa parte dos resultados do desmatamento foram frutos do trabalho desses trabalhadores”, sim, portanto, “é uma afirmação justa da parte deles”, mas ponderou “nós trabalhamos com limitações” (leia aqui).
DESMATAMENTO
The Guardian traz uma série de gráficos que demonstram que “nenhum único país do G20 tem políticas em vigor que sejam consistentes com o objetivo do Acordo de Paris de limitar o aquecimento global a 1,5ºC e cumprir a sua “quota justa” de redução de emissões”. A avaliação é baseada em dados fornecidos pelo Climate Action Tracker. Sobre o Brasil, diz o texto, “depois de quatro anos sob o governo do linha-dura de direita Jair Bolsonaro, Luiz Inácio Lula da Silva, do Partido dos Trabalhadores, foi eleito presidente no ano passado com promessas de reduzir o desmatamento e proteger os direitos dos povos indígenas. A quantidade de floresta desmatada diminuiu significativamente, mas o país ainda é um grande produtor de combustíveis fósseis e tem um sector agrícola altamente poluente”.
“A notícia de que o Brasil está prestes a alinhar-se com o cartel petrolífero da Opep foi recebida com decepção por muitos ativistas. O Brasil também planeja realizar um leilão para blocos de perfuração de petróleo em áreas ecologicamente sensíveis ainda este mês. No entanto, o Brasil melhorou este ano as suas metas de redução de emissões após terem sido reduzidas pela administração Bolsonaro e, como anfitrião da Cop30 em 2025, Lula está sob pressão para ser visto como um líder climático” (leia aqui e veja o diagnóstico de vários países)
The Conversation traz o podcast “Seca sem precedentes na Amazônia ameaça liberar enormes reservas de carbono” sobre as possíveis consequências da seca em curso na região amazônica. “Os cientistas temem que isso possa libertar milhares de milhões de toneladas adicionais de carbono na atmosfera”, alerta a reportagem (Ouça aqui).
FOTO DE CAPA: 63ª Cúpula de Chefes de Estado do Mercado Comum do Sul (Mercosul), ocorrida nesta quinta-feira (7), no Museu do Amanhã, na região portuária do Rio. Foto: Tânia Rego/Agência Brasil.
Repórter do Fórum 21, com passagem por Carta Maior (2014-2021) e Blog Zé Dirceu (2006-2013). Tem doutorado em Semiótica (USP) e mestrado em Crítica Literária (PUC-SP).