Nazismo de ontem, perigo de hoje
Mais que oportuna é a estreia da série Hitler e o Nazismo: Começo, Meio e Fim, de Joe Berlinger, em seis episódios de uma hora cada um, bem produzidos e envolventes, lançada este mês no streaming. Mesmo não se constituindo arte cinematográfica, é uma série do modelo audiovisual que deve ser considerada neste momento, apesar do tema histórico visitado e revisitado milhares de vezes. Não só pela qualidade da sua montagem e produção, mas por ser tão atual nesse tenso momento em que se vive internamente e no mundo, e pela linguagem visual, formal, atraente e pedagógica. É uma série a ser vista pelos mais idosos, para alguns que se esqueceram do que foi vivido e do quanto custou ao mundo, nos anos 30/40, a guerra genocida nazista. Uma série que deve ser conhecida também pelas novas gerações, estudantes e jovens em geral.
Hitler and the Nazis: Evil on Trial se inicia com um Adolf Hitler jovem e pobre vendendo as pinturas de cartão postal produzidas em casa, como um camelô de rua. Hitler não sabia retratar pessoas. Vê-se também o desinteresse dos eventuais fregueses pelos seus trabalhos e a sua paixão pela ópera, especialmente pelas obras de Wagner. Hitler gastava o dinheiro que não tinha para frequentar a ópera até que a guerra veio e ele correu para se inscrever no exército como mensageiro, onde permaneceu durante quatro anos.
Mas o conjunto de imagens de cenas do julgamento de Nuremberg é protagonista da série, desse ‘julgamento do Mal’ com sequências remasterizadas de sessões do tribunal e imagens inéditas até então que ajudaram historiadores a conhecerem detalhes históricos, preciosidades de arquivo que esclareceram os horrores do dia a dia no campo de concentração de Auschwitz e pormenores do incêndio do gueto de Varsóvia.
Vozes originais dos réus, sequências encenadas ou tratadas com Inteligência Artificial fornecem um tom de atualidade e um novo impacto às ações denunciadas e praticadas pelos asseclas mais próximos de Hitler, que ainda eram vivos durante Nuremberg: Joachim Von Ribbentrop, Rudolph Hess, Wilhelm Keitel, Albert Speer e tantos outros que não tinham se suicidado.
Por meio da IA, por exemplo, foi remasterizada a voz de William Shirer, autor do famoso livro Ascensão e Queda do Terceiro Reich, renomado jornalista e historiador estadunidense que cobriu o início da Segunda Guerra Mundial diretamente da Alemanha, onde trabalhou para o rádio norte-americano até 1940. Ele é interpretado pelo ator húngaro Balázs Kató.
Mas, em geral, as vozes dos atores que encenam personagens reais não são ouvidas. As vozes gravadas dos personagens reais é que são usadas e alternam com entrevistas de autores que escreveram sobre a corte de Nuremberg e sobre as lúgubres ações praticadas pela Alemanha nazista na Europa ocupada. Contra judeus, em sua maioria, e contra minorias, populações da região dos Sudetos, da Polônia, da Europa central e, em seguida, de praticamente todo o continente não-ariano.
Foram seis milhões de vítimas entre os judeus, segundo a Enciclopédia do Holocausto, do Museu Memorial do Holocausto dos Estados Unidos.
Os seis episódios de Hitler e o Nazismo: Começo, Meio e Fim exploram a ascensão e queda de Adolf Hitler e do partido nazista, e seguem até os julgamentos de Nuremberg, que duraram dez meses, de 1945 a 1946, com a presença na sala de 400 jornalistas acompanhando os trabalhos. São 35 horas de filmagens inéditas e 1.200 horas de áudio.
A força dessa série vem, em especial, de áudios e das gravações recuperadas há poucos anos e exibidas no documentário Nuremberg – As Fitas Perdidas, do National Geographic e disponível no Star+.
Segundo o Museu Memorial do Holocausto, o julgamento histórico terminou em outubro de 1946 com a pena de morte para doze dos acusados, prisão perpétua para três, quatro penas de dez a vinte anos de prisão, e três absolvições. Joseph Goebbels e Heinrich Himmler se suicidaram quando estavam presos em Nuremberg.
Nos seis episódios assiste-se e ouve-se trechos da interpretação de Hitler como competente ator em seus comícios, que eram autênticos espetáculos de teatro dramático, ele como um desavergonhado mentiroso, como manipulador de militares alemães veteranos e aposentados, e cuspindo slogans familiares e ainda hoje copiados e utilizados pelos grupos de extrema direita neofascista nas suas manifestações grotescas em países do mundo ocidental.
Alguns dos mantras: “Toda cobertura de imprensa é boa, mesmo quando é negativa”. Ou “Faremos a Alemanha great again”, prometido durante a formação do partido nazista. Os anúncios da criação de forças/milícias SAS, paramilitares; o impulso dado à autodissolução do parlamento; e a prática hoje repaginada fielmente de destruir instituições democráticas realizada ‘por dentro do regime’.
Até suicidar-se no seu bunker em companhia de Eva Braun, Hitler foi responsável por sessenta milhões de corpos assassinados e de outros milhares de restos de cadáveres espalhados pela Europa.
Os episódios desse documentário sobre o julgamento do Mal são:
1. Origem do Mal
2. Ascensão do Terceiro Reich
3. Hitler no Poder
4. O Caminho para a Ruína
5. Crimes contra a Humanidade
6. O Acerto de Contas
Atualmente, está se realizando, até julho próximo, uma reunião de membros do Conselho de Direitos Humanos da ONU, em Genebra, da qual sairão um relatório e um documento oficial informando a expansão dos movimentos neonazistas mais preocupantes, atuais e atuantes em vinte países (manifestações públicas e organizadas de ódio, crimes violentos, perseguições de professores nas escolas, etc.), e a formação de um grupo de Combate ao Crescimento de Células Neonazistas. O Brasil está na lista.
*Disponível na Netflix
Jornalista.